6 de julho de 2011

Sobre fazer robôs

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos.

Álvaro de Campos, Tabacaria


Quando criança, afoito por antes mesmo de crescer decidir o que ser (coisa de criança de cidade grande), um dia após desenhar um robô e me achar um engenheiro, perguntei ingenuamente para minha mãe se engenheiros apenas desenhavam os robôs. Na resposta minha mãe me ofereceu uma pequena dose de realidade, dizendo que não, que os engenheiros não apenas desenhavam, mas projetavam todo o robô: da sua forma externa a cada uma de suas porcas parafusos, tudo passaria pelo engenho do engenheiro. Achei isso extremamente exaustivo e desestimulante, o fim do mundo. Resolvi então, que não queria mais ser um engenheiro.

Sim, ao abandonar o projeto do meu primeiro robô, com alguns anos de antecedência definitivamente vivi o fracasso com relação a números, medidas e cálculos que a partir da sexta série seria uma constante em minha vida escolar. Mas o que posso fazer se sempre me apeguei mais às linhas gerais, às formas das coisas, do que aos seus detalhes?

Duas décadas depois e com um substancial know-how em rascunhar milhares de robôs e concluir o projeto de apenas algumas dezenas, me vejo agora numa dessas situações limite que clareiam o entendimento sobre toda uma vida e fazem a gente entender pequenos eventos que ficaram lá na memória, como meu primeiro robô.

No exercício diário de escrever minha dissertação de mestrado, o que posso dizer tranquilamente que é o meu atual trabalho - e no literal entendimento da palavra -, vejo à minha frente milhares de porcas, parafusos, conectores, fios, plugues, toda uma sorte de coisas que preciso juntar cada uma no seu lugar certo, para fazer com que meu robô mais especial abra os olhos. Escrever uma dissertação é um trabalho de muito engenho também. Neste sentido, por mais que eu tenha fugido dos números e cálculos (e depois dos papéis, das bancadas…), me vejo agora nessa oficina das palavras onde dia após dia, tento trazer à vida esse mundo de pecinhas soltas. Esta é uma engenharia muito especial: não de números, mas de palavras e idéias.

Para aquela dúvida, "o que ser quando crescer", ainda que tudo indique que já cresci, não tenho resposta. E já não sei se quero uma: acho que desisti de ser algo, justamente quando cresci. Resolvi foi construir robôs, dos mais variados: textuais, imagéticos, psicodélicos, ideológicos, poéticos, musicais. Parece, resolvi antes estar do que ser.

Aliás, sim, há uma escolha nisso tudo! Escolhi sempre me perder entre novas porcas e novos parafusos, que inexperimentados me mostram outras possibilidades de novos robôs. Eu não cresci para escolher o que ser. Eu cresci para escolher diariamente o que fazer. E assim, deixo o tempo me levar.

o simpático robô Wall-E

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